Pesquisadores observaram que mesmo indivíduos com poucos anos de escolaridade apresentaram comprometimento cognitivo mais baixo quando comparados àqueles sem educação formal (Foto: Pixabay)
Educação, diferentemente da ocupação profissional, foi relacionada à melhores habilidades cognitivas independente da presença de lesões neuropatológicas, segundo estudo
Um estudo liderado por pesquisadores da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (FMUSP) e publicado em 3 de janeiro deste ano pela revista científica Alzheimer's & Dementia, umas das mais importantes da área de Neurociências, destaca a importância do tempo de escolaridade para mitigar os efeitos das lesões cerebrais na diminuição de habilidades cognitivas, incluindo memória, atenção, função executiva e linguagem.
Quando comparados com aqueles sem educação formal, os participantes que possuíam algum nível de escolaridade tiveram, em média, pontuações mais baixas na escala utilizada pelos pesquisadores para medir o comprometimento cognitivo, ou seja, demonstraram menor grau de deterioração das funções neurológicas e menos sinais de demência.
“Quanto maior a escolaridade, maior a reserva cognitiva”, diz a Profa. Dra. Claudia Kimie Suemoto, primeira autora do estudo e Professora Associada da Disciplina de Geriatria da FMUSP. Ela explica que essa reserva funciona como uma espécie de poupança, ou seja, quanto maior a reserva cognitiva, maior carga de lesões neuropatológicas a pessoa consegue suportar na terceira idade.
Ao analisar indivíduos com a mesma quantidade de lesões de Alzheimer, por exemplo, seria razoável esperar que estes apresentassem sinais da doença no mesmo estágio de desenvolvimento. O estudo, entretanto, observou uma realidade diferente. "Quem tinha maior escolaridade, embora tivesse bastante lesões, acabou não manifestando a doença com a mesma intensidade”, explica a Profa. Claudia Suemoto.
A pesquisa
O estudo observou 1.023 indivíduos diferenciados entre aqueles sem educação formal, com 1 a 4 anos de escolaridade, e com 5 anos ou mais anos de escolaridade. Também analisou a ocupação profissional dos participantes, definida como o trabalho que eles mais realizaram durante a vida e classificada entre qualificada (por exemplo, médico, professor, gerente), semiqualificada (por exemplo, lojista, motorista, segurança) e não qualificada (por exemplo, trabalhador agrícola, empregada doméstica, jardineiro).
"Existem na literatura alguns trabalhos mostrando que o tipo de ocupação poderia diminuir o risco de demência, mas não encontramos isso em nosso estudo”, diz a Profa. Claudia Suemoto. “Somente a escolaridade, que as pessoas geralmente adquirem na primeira infância e na adolescência, parece diminuir esse risco”, completa.
A diferença, segundo a pesquisadora, é que os estudos anteriores foram feitos principalmente na Europa e nos Estados Unidos, onde a realidade socioeconômica da população é muito distinta. “Para você ter uma ideia, a escolaridade média na Europa é de 16 anos, nos Estados Unidos, de 12 anos, e em nosso estudo, de apenas 4 anos. Um número, infelizmente, muito baixo.”
A boa notícia é que mesmo esses poucos anos de escolaridade parecem proteger contra demência durante o envelhecimento. Entre os participantes da pesquisa, 19% não tinham educação formal e 58% possuíam apenas de 1 a 4 anos de escolaridade. Mesmo assim, essa quantidade foi suficiente para os pesquisadores observarem índices de comprometimento cognitivo mais baixos no segundo grupo quando comparados àqueles sem educação nenhuma.
Para a Profa. Claudia Suemoto, isso denota a importância de políticas públicas voltadas para redução da desigualdade socioeconômica em países em desenvolvimento, como o Brasil. ”Quanto melhor a situação socioeconômica no começo da vida, maior a chance da pessoa ir para escola e, principalmente, obter uma educação de melhor qualidade. Então, esses dois fatores estão associados.”
Fonte: Assessoria de Comunicação da FMUSP
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